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quinta-feira, 10 de julho de 2008

Nos últimos dez anos tenho viajado freqüentemente pelo
sertão de Pernambuco, e assistido, não sem revolta, a um
processo cruel de desconstrução da cultura sertaneja com
conivência da maioria das prefeituras e rádios do
interior. Em todos os espaços de convivência, praças,
bares e na quase maioria dos shows, o que se escuta é
música de péssima qualidade, que não raro, desqualifica
e coisifica a mulher e embrutece o homem.

O que adianta as campanhas bem intencionadas do governo
federal contra o alcoolismo e a prostituição infantil,
quando a população canta: 'beber, cair e
levantar' ou 'dinheiro na mão e calcinha no
chão'. O que adianta o governo federal criar novas
delegacias da mulher se elas próprias também cantam e
rebolam ao som de letras que incitam à violência sexual?

O que dizer de homens que se divertem cantando: 'vou
soltar uma bomba no cabaré e vai ser pedaço de puta pra
todo lado'. Será que são esses trogloditas que
chegam em casa depois de beber, cair e levantar e surram
suas mulheres e abusam de suas filhas e enteadas? Por onde
andam as mulheres que fizeram o movimento feminista, tão
atuante nos anos 70 e 80, que não reagem contra essa onda
musical grosseira e violenta? Se fazem alguma coisa, tem
sido de forma muito discreta, pois leio os três jornais de
maior circulação no estado todos os dias, e nada encontro
que questione tamanha barbárie. E boa parte dos meios de comunicação são coniventes, pois existe muito dinheiro e interesses envolvidos na disseminação dessas músicas de baixa qualidade.

E não pensem que essa avalanche de mediocridade atinge
apenas os menos favorecidos da base de nossa pirâmide
social, e com menor grau de instrução escolar. Cansei de
ver (e ouvir) jovens que estacionam onde bem entendem,
escancaram a mala de seus carros exibindo, como pavões
emplumados, seus moderníssimos equipamentos de som e
vídeo na execução exageradamente alta dos cd's e
dvd's dessas bandas que se dizem de forró eletrônico.
O que fazem os promotores de justiça, juizes, delegados que
não coíbem, dentro de suas áreas de atuação, esses
abusos?

Quando Luiz Gonzaga e seus grandes parceiros, Humberto
Teixeira e Zé Dantas criaram o forró, não imaginavam que
depois de suas mortes essas bandas que hoje se multiplicam
pelo Brasil praticassem um estelionato poético ao usarem o
nome de forró para a música que fazem. O que esses
conjuntos musicais praticam não é forró! O forró é
inspirado na matriz poética do sertanejo; eles se inspiram
numa matriz sexual chula! O forró é uma dança alegre e
sensual; eles exibem uma coreografia explicitamente
sexual! O forró é um gênero musical que agrega
vários ritmos como o xote, o baião, o xaxado; eles
criaram uma única pancada musical, que em absoluto, não
corresponde aos ritmos do forró! E se apresentam como
bandas de forró eletrônico! Na verdade, Elba Ramalho e o
próprio Gonzaga já faziam o verdadeiro forró
eletrônico, de qualidade, nos anos 80.

Em contrapartida, o movimento do forró pé-de-serra deixa
a desejar na produção de um forró de qualidade. Na
maioria das vezes as letras são pouco criativas;
tornaram-se reféns de uma mesma temática! Os arranjos
executados são parecidos! Pouco se pesquisa no valioso e
grande arquivo gonzaguiano. A qualidade técnica e visual
da maioria dos cds e dvds também deixa a desejar, e falta
uma produção mais cuidadosa para as apresentações em
geral. Da dança da garrafa de Carla Perez até os dias de
hoje formou-se uma geração que se acostumou com o lixo
musical! Não, meus amigos: não é conservadorismo, nem
saudosismo! Mas não é possível o novo sem os alicerces
do velho! Que o digam Chico Science e o Cordel do Fogo
Encantado, que inspirados nas nossas matrizes musicais,
criaram um novo som para o mundo! Não é possível
qualidade de vida plena com mediocridade cultural,
intolerância, incitamento à violência sexual e ao
alcoolismo!

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