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sábado, 25 de abril de 2009

ACM Neto e o darwinismo político brasileiro ao contrário

Essa onda de escândalos éticos e morais no Congresso se refere aos integrantes da Câmara e do Senado –e não ao Poder Legislativo em si. Essa distinção é importante. Muita gente anda defendendo saídas para lá de heterodoxas, impróprias e antidemocráticas. O que parece ser necessário é gente mais decente ali dentro, não simplesmente descartar o Congresso.



Tome-se o caso dos corregedores da Câmara, ACM Neto (DEM-BA), e do Senado, Romeu Tuma (PTB-SP). Não fazem absolutamente nada em meio à atual tsunami de desvios. Clique aqui para assistir a um vídeo sobre os dois, mostrando a fama de engavetadores que já estão consolidando.



No caso de ACM Neto, o deputado baiano dá hoje mais uma evidência de como os valores estão em falta na Câmara. O corregedor foi citado pela coluna “Painel”, da Folha (aqui, para assinantes), e indagado se teria usado passagens da Câmara para viajar com a mulher a Paris.



Eis o que respondeu ACM Neto: “Isso pode ter acontecido (...) Mandei fazer um levantamento, pode ter sido um reembolso da Varig”.



Como assim? Ele não se lembra? Pode ter sido? Não custa lembrar que, como corregedor, será ACM Neto o responsável por examinar o uso indevido de bilhetes por seus pares. Não consegue se lembrar se viajou a Paris com a mulher nem exatamente quem pagou pela viagem. O internauta pode fazer um teste. Pergunte a qualquer cidadão de bem se é possível viajar ao exterior e não se lembrar quem pagou as despesas. Quem não responder imediatamente sofre de amnésia ou não é flor que se cheire.



Mas, digamos que a passagem para o passeio por Paris tenha sido mesmo emitida pela Câmara e paga com o dinheiro público. E daí? Fala ACM Neto: “Não há ilícito. A passagem era vista como uma vantagem do parlamentar, que economiza. Não tem que devolver porque não houve erro. A Casa toda fez”.



E mais: “Acho que está na hora de a Casa ter coragem de se defender. Estão colocando nomes de pessoas sérias como se fossem bandidos! Acho que a imprensa quer fechar o Congresso”.



Como assim? A imprensa noticia os fatos e quer fechar o Congresso? Ou seriam os deputados os verdadeiros interessados no fechamento do Congresso ao fazer viagens indevidas e enlamear a imagem do Poder Legislativo?



Sobre a resposta padrão de ACM Neto –“não há ilícito”– trata-se de um ato de ignorância, de uma malandragem ou das duas coisas juntas. O corregedor confunde direito público com direito privado. O argumento para a farra das passagens (e de outras) foi a inexistência de "regras claras definindo os limites", como escreveu o próprio deputado Michel Temer (PMDB-SP), presidente da Câmara.



Mas eis o que ensinou num post do dia 2 de abril o jurista Sepúlveda Pertence: "Ao contrário do particular que pode fazer tudo que a lei não proíbe, o administrador só pode quando a lei determina ou autoriza. Trata-se do princípio da legalidade. O agente público age em nome do Estado e vinculado ao Estado”. Ou seja, se a lei ou a regra não davam permissão explícita, o uso indiscriminado de passagens estava proibido.



Conclusão: ACM Neto e outros 260 deputados, de janeiro de 2007 a outubro de 2008, viajaram 1.887 vezes ao exterior. Estavam claramente quebrando uma regra, cometendo atos irregulares. A não ser que o patrimonialismo mental dessa turma os exima de seguir o direito público. Eles querem ser congressistas e seguir apenas os ditames do direito privado. Acham que o Congresso é a casa deles. Na prática, está sendo mesmo.



Ao considerar que “não há ilícito” e que a “a imprensa quer fechar o Congresso”, o corregedor ACM Neto ajuda a comprovar uma funesta teoria darwinista ao contrário –quando o assunto é política brasileira. Basta olhar para os antepassados de ACM Neto. Muitas vezes, as gerações mais novas são menos evoluídas do que as passadas, por incrível que possa parecer.



Mas, não nos enganemos. A resposta deve ser dada pelos eleitores. Ou não. A depender da abulia atávica do brasileiro médio, a coisa vai longe. A propósito, basta lembrar do filme “Terra em Transe” (1967), de Glauber Rocha, citado no post abaixo. Em uma cena antológica, um ator representa o povo. É humilhado. Não reage. Jardel Filho, sarcástico, diz: ““Está vendo o povo? Um imbecil, um analfabeto. Já pensaram o povo no poder?”.



Hoje, o mundo é outro. Neste ano, já são 34 escândalos no Congresso. Só neste ano... 34 escândalos no Poder Legislativo.

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