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sexta-feira, 10 de abril de 2009

Sexo, para ela, era como beber água

RUY CASTRO


Ao ouvir no rádio a notícia da morte de Marilyn Monroe, há 45 anos no dia de hoje, a primeira reação foi a de que devia haver um engano: "Como? Marilyn, morta?" Ela era uma estrela, maior que a vida, maior até que as telas em cinemascope que levavam os seus filmes. Como uma pessoa assim podia morrer?
Uma das razões do impacto de sua morte em 1962 é que, para quase todo mundo, Marilyn era uma pessoa da família. Estávamos tão habituados à sua presença, nos cinemas, nos jornais e nas revistas, que era impossível imaginá-la morta. E um motivo para essa familiaridade é que, ao contrário do que se possa pensar, Marilyn -o supersímbolo sexual, a mulher mais desejada de seu tempo- não era ofensiva. Até as platéias femininas "gostavam" dela. As masculinas, nem se fala.
Vide "O Pecado Mora ao Lado", de 1955, o filme que melhor explorou seus fabulosos relevos e curvas. Marilyn estava tão bonita dentro daqueles vestidos justos que não parecia de verdade -ninguém podia ser tão gostosa. Era quase uma mulher de desenho animado, impossível de existir na vida real. Ao mesmo tempo, ela não tinha culpa se os homens a desejavam como loucos. E, não tendo culpa, era inocente -a malícia estava nos outros. Era o que seus personagens passavam nos filmes e era o que ela passava na vida real.

Como beber água
O sexo, para ela, era como beber água, escovar os dentes ou telefonar. Algo a ser feito sem culpa, um simples meio para um fim ou para fim nenhum -porque a mesma mulher que se submetera a incontáveis sofás de executivos de Hollywood podia também, numa filmagem, esnobar o galã para ficar com o humilde carregador do cabo de som, para uma sessão depois do expediente, como se diz que aconteceu.
A prova de que Marilyn era mais inocência que malícia é que era quase pobre. Seu salário na Fox perdia longe para o de Elizabeth Taylor, que, por sua vez, nem se comparava aos rendimentos de Doris Day, então a maior bilheteria do cinema. Quando se tratava de negócios, Marilyn era quase uma amadora: não tinha poços de petróleo, nem ações no banco, nem casas de praia ou de campo. Tinha apenas sua casinha em estilo mexicano, recém-comprada, em Brentwood -a primeira e única em seu nome, depois de 40 endereços diferentes, todos alugados, desde o início da carreira. Não tinha também muitas jóias, nem um grande guarda-roupa. Nos anos 60, esse despojamento ainda não era normal.
Dois meses antes de sua morte, e porque o dinheirinho lhe viria a calhar, Marilyn aceitou um convite da revista "Vogue" para uma sessão de "nus" com o fotógrafo Bert Stern. Estava com uma feia cicatriz de uma recente cirurgia de vesícula, mas não pediu maquiador -contava com o retoque manual no filme, que era praxe. Ao se despir inteira para as fotos, não iria se cobrir em detalhes.
Para quem, como eu, cresceu (em todos os sentidos) vendo aquela Marilyn perfeita, inigualável, inatingível e se apaixonando por ela filme após filme, é refrescante espiar essas fotos em que a cicatriz não foi retocada. Elas refletem uma mulher de 36 anos, ainda mais apaixonante -uma mulher que começava a conviver com suas imperfeições, tentando existir acima e além do próprio mito. O que ela teria conseguido, se o Nembutal não a tivesse levado antes.

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