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sábado, 13 de dezembro de 2008

A saga(WALMAR BUARQUE)

É uma questão de tempo, e não muito tempo, talvez uns poucos anos para uma situação hoje imaginada tornar-se realidade.
Essa perspectiva, esse prognóstico é de que sejam estas atividades hoje exercidas nas ruas por jovens adultos como a de limpar vidros de carros, "guardadores" de carros nas ruas e da venda de feijão, frutas, etc... as últimas alternativas e expectativas deles conviverem pacificamente com a sociedade, não será a sua benevolência ou caridade em pagar pelo "serviço" ou agradá-los com pequeno troco disponível nos bolsos que irão satisfazê-los no futuro não muito distante. Nós não sabemos o quanto eles estão dispostos a resistir antes de pegar num três oitão (revólver) e procurar um meio mais fácil de tirar o que eles precisam.
Mas tudo isso acontece pelo descaso, omissão e uma efetiva falta de política pública municipal e estadual para a assistência social. Logo quando eles chegam de diversos municípios ainda pequenos, até recém nascidos com toda a família, sempre numerosa e também de outros estados.
No caso específico dos municípios alagoanos, o descaso é contado pelos que abandonados a própria sorte, contam nas entrevistas aos que pesquisam nas ruas e praças a origem e a situação vivida por aquela família. Sempre é a mesma estória. Os prefeitos apesar de terem secretários de assistência social, Conselhos Tutelares e outros cargos não se preocupam nem viabilizam uma situação estável para seus moradores de baixa renda. Sem saúde, nem mesmo uma maternidade em muitos municípios, sem assistência social, enfim, tornam-se os sem-nada e tomam a estrada como alternativa para não morrer a míngua na terra em que nasceu. Em muitos casos eleitores daqueles que os abandonaram e que irresponsavelmente não são sequer questionados ou investigados pelos governos estadual e federal dos recursos que são destinados a evitarem esse horroroso êxodo.
Pronto, chegaram em nossa capital. Para onde vão? De início dois pontos são referências para os sem-nada: marquise da Lojas Americanas na Praia da Avenida para os que vêm pelo litoral e a Praça Centenário para os que vem pelo interior.
Com a família "instalada", naturalmente é o homem, pai de mais de cinco filhos no mínimo e marido da esposa grávida, o primeiro a tomar a iniciativa de buscar alguma coisa "pra nós". Uma tentativa frustrada, outra e outra, na próxima traz alguma coisa, divide como pode, e com moral diz: - Vou ver se consigo mais, volto já! Três dias se passaram e nada, sumiu, não mais voltou. O que aconteceu? Ninguém sabe. Pode ter acontecido tudo: um atropelamento, foi preso, ficou bêbado, foi morto ou o mais provável foi procurar sua vida abandonando a mulher e os filhos .
A mulher na sua sabedoria e resignação sabe o que aconteceu e se vê só com cinco filhos na calçada e um na barriga, não titubeia e toma uma decisão: os três maiores, um de 10, outro de 8 e o de 7 anos ela pede para procurar o pai e ver se arranja alguma coisa para comer; e assim eles vão e se distanciam do ponto de referência, às vezes juntos, outras separados. É aí que a mãe grávida e com fome, pega pelas mãos os dois menores de 2 e 3 anos e propositalmente sai do local conhecido pelos outros e assume a responsabilidade de que pelo menos com os dois menores e o da barriga ela poderá dar algum sustento e foge abandonando os outros três como o pai já havia os abandonados.
É aí que começa a saga dos meninos e meninas de rua.
Nesse ínterim, no município de origem dessa desfeita família, se comemora a sua emancipação, sua padroeira com ostentação e gastos exorbitantes, e em outras tantas festas comemorativas, sem se dar conta do quanto é cruel e irresponsável com seu povo.
Aqui na capital, os fóruns, os congressos, as conferências, as capacitações, os encontros e tantas outras atividades tentam viabilizar uma situação insustentável, não de pobreza, mas sim de falta de vergonha de nossos dirigentes, pseudos responsáveis por esse pobre povo, massa de manobras que fomentam enriquecimento ilícito de tantos que realimentam essa situação.
No desencontro, na separação, no abandono, toda aquela dificuldade que já existia, vira uma tragédia pessoal para cada um. Tanto para o pai, para mãe com os filhos menores que serão abandonados mais tarde, como para os maiores, que enganados se sentiram traídos e esquecidos pelos que até então era sua família.
Como vivenciar uma situação dessa? Sem que não tenha como defesa a violência e o descaso pela vida humana, de outros que para eles são todos iguais como os seus pais.
Quem sofre tantas injustiças, só poderá responder com mais injustiças.
E por que poderia ser diferente?!
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